Chamava pelos camaradas para virem pecar comigo.
Lembro-me do tesouro que Jesus e a Mãezinha guardaram no meu coração, mas já não tenho aquelas ânsias de o guardar e de tudo fazer por ele. Agora já não me preocupa. Estou como que cansada de tudo por ele ter feito. O que agora me faz sofrer, e sofrer deveras, é sentir que tudo o que podia fazer fiz e agora mais nada posso fazer para o salvar.
– Ó meu Jesus, que hei-de eu fazer, que hei-de eu sofrer? Eu quero a todo o custo salvar a humanidade, e a minha alma sente que não tem mais que dar, que não tem mais que fazer, que não há sofrimento o qual não sofresse por ela. Ó meu Deus, que penoso martírio! Remediai Vós, meu Jesus, remediai este mal. Tendes o meu corpo, tendes o meu sangue, é Vosso, utilizai-Vos, para que o mundo seja salvo. Não o deixeis mais sair do meu coração. Não me deixeis ter mais um momento de vida que não seja para Vos amar e para o amar a ele. O mundo, Jesus, as almas, o preço do Vosso sangue não quero que ele seja calcado aos pés, não quero que sirva de condenação para as almas. Estou pronta, meu Jesus, a dar a minha vida a cada momento, enquanto o mundo for mundo, se isso for possível, para as salvar. Jesus, sou vítima do mundo, primeiro que tudo do Vosso divino amor.
No dia 13, entre visitas de muita estima, veio uma que eu já esperava e que muita falta tinha feito à minha alma. Esperava-a e recebi-a friamente; tudo me era indiferente. Olhava-a e por vezes parecia-me não a ver, não ser a realidade. Era um preso, saído da prisão, visitar um cadáver que lhe pertencia. Ó dor, ó amargura, ó trevas aterradoras. Já é tarde para me darem alegria, já é tarde para receber consolação a minha pobre alma. Os meus olhos pareciam não verem o segundo roubo que me foi feito. O que será ao ser-me restituído o primeiro?
– Jesus, sou a Vossa vítima, o Vosso amor, a salvação das almas, a todo o custo, a todo o custo. Agora sofro pela minha frieza, a minha indiferença por essa visita a quem tanto devo. Parece-me que a desgostei, que a feri. Ó Jesus, sempre tudo pelo Vosso amor.
Durante a noite, que passei quase sempre alerta e unida a Jesus e no meio dum mar de dores de corpo e da alma, fui assaltada cruelmente pelo demónio. Lutei com ele perto de duas horas. Nuns momentos, dizia-me pecar com um, noutros, dizia-me pecar com outros. Chamava pelos camaradas para virem pecar comigo. Quando eu conseguia não dizer nem fazer aquilo que ele queria, enraivecia-se muito mais ainda e, para despedaçar-me, formava saltos desesperados. Quando podia, bradava ao céu; quando não podia, lutava só. Nuns momentos muito assustadores, disse:
(Sentimentos da alma, 16 de Janeiro de 1945)
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