quarta-feira, outubro 30, 2019

OFERECI-ME A NOSSO SENHOR


Terminei a última emissão afirmando que “uma nova Alexandrina vai nascer (…), uma Alexandrina que em breve se vai oferecer ao Senhor e tornar-se uma alma-vítima, uma santa de Deus”.
Será pois desse oferecimento a Deus que hoje irei falar, por ser um acto também heróico que vai transformar toda a vida dela e torná-la simplesmente uma vida de oração e de doação contínua.
Alguns anos depois do salto pela janela, a Alexandrina em 24 de Abril de 1924, acamou para sempre. Tinha então 20 anos.
Nos primeiros tempos jogava às cartas com as amigas e assim ocupava os seus longos momentos do dia. Chegou também a fazer novenas, com sua mãe e com a irmã, para obter a sua cura, mas estas preces, à primeira vista, de nada serviram e ela continuou sofrendo no seu leito.
Mas esta situação vai mudar: Deus vai tocar mais fortemente o seu coração juvenil e inspirar-lhe o que deve fazer.
Na sua autobiografia ela explica:
– Sem saber como, ofereci-me a Nosso Senhor como vítima.
Esta confissão que parece ingénua é na verdade um acto heróico, maior do que se atirar pela janela, maior do que qualquer outra promessa em caso de cura.
A Alexandrina diz que “vinha, desde há muito tempo, a pedir o amor ao sofrimento”, constata que “Nosso Senhor concedeu-lhe tanto, tanto esta graça que hoje não trocaria a dor por tudo quanto há no mundo.”
Mais ainda, ela confessa que “com este amor à dor, toda me consolava em oferecer a Jesus todos os meus sofrimentos” porque “a consolação de Jesus e a salvação das almas era o que mais me preocupava.”
Amar o sofrimento pelo que ele é, chama-se a isso masoquismo, mas amar o sofrimento para o oferecer pela salvação das almas é heroísmo, é amar o próximo e desejar ardentemente a sua salvação eterna.
“Com a perda das forças físicas, fui deixando todas as distracções do mundo e, com o amor que tinha à oração – porque só a orar me sentia bem – habituei-me a viver em união íntima com Nosso Senhor.
Que transformação!
A partir de então, tudo muda para ela, como ela mesma o explica:
“Quando recebia visitas que me distraíam um pouco, ficava toda desgostosa e triste por não me ter lembrado de Jesus durante esse tempo.”
Neste enleio com Jesus e Maria, o tempo vai passando.
Alguns anos mais tarde, em 1928, a paróquia de Balar organiza uma peregrinação a Fátima. A Alexandrina tem de novo o desejo de cura e pede para ir a Fátima, mas o Pároco e o médico não autorizam a viagem, dado o estado dela.
A consequência desta recusa, é para ela um motivo mais da aceitação da vontade de Deus. Então um pensamento muito particular vem ocupar a sua mente:
“Jesus está prisioneiro no Tabernáculo; também eu sou prisioneira”.
E esta curta oração vinha naturalmente aos seus lábios, ditada pelo seu nobre coração:
«Amo-Vos, Jesus, de todo o meu coração. Compadecei-Vos desta pobre doentinha e levai-a para Vós quando for da Vossa vontade. Sim, amado Jesus? Nunca Vos esqueçais de mim, que sou uma grande pecadora.»
Na próxima emissão falarei do seu amor aos sacários e da oração que ela compôs para eles…
Afonso Rocha

segunda-feira, outubro 28, 2019

O SALTO PELA JANELA


A emissão de hoje reveste uma importância particular na vida da beata Alexandrina.
O acontecimento que vou contar passou-se no dia 30 de Março de 1918, portanto no dia em que ela festejava os seus 14 anos.
A janela pela qual a Alexandrina saltou para o quintal

Alexandrina encontrava-se na sala com a irmã Deolinda e uma amiga delas. Deolinda costurava e elas ajudavam.
A um momento dado elas avistaram três homens que subiam a rua na direcção da casa. Um deles era o antigo patrão da Alexandrina, aquele homem que a tinha tratado tão mal ainda há bem poucos meses.
Deolinda sentiu que poderia haver perigo e fechou a porta à chave.
Pouco depois batiam. Depois de perguntar quem eram e o que desejavam, ela respondeu que não abria, porque eles nada tinha a fazer ali em casa. O antigo patrão da Alexandrina insistiu, mas vendo que nada conseguia, decidiu passar pelo rés-do-chão onde havia um alçapão que dava acesso à sala onde estavam as três raparigas.
Deolinda compreendendo o intento dele colocou a máquina de costura em cima do dito alçapão, para evitar que eles o abram.
Sentindo-se frustrado, o homem cujos maus instintos não deixavam dúvidas, começou a bater no alçapão com um malho que ali se encontrava e acabou par partir algumas tábuas e os três entraram na sala, indo logo ao encontro das três moças desamparadas. Alexandrina dá-nos conta assim:
«Minha irmã, ao ver isto, abriu a porta da sala para fugir, mas essa ficou presa, e eu, ao ver tudo isto, saltei pela janela que estava aberta e que deitava para o quintal.»
O tombo foi tremendo, porque a janela estava a uns quatro metros do chão. Sentiu uma grande dor na espinha e faltar-lhe o folego. Mas logo que se sentiu um pouco recuperada, pegou num pau que ali estava no chão e correu para ir defender a irmã e a amiga, ameaçando de se pôr a gritar se eles não fossem embora.
Temendo que algum vizinho acorresse e os molestasse, os três homens abandonaram as presas e foram embora.
Depois da partida dos tristes e maldosos indivíduos, as três raparigas voltaram ao trabalho que estavam fazendo, como se nada se tivesse passado, prometendo nada dizerem a Maria Ana, a mãe das duas irmãs. Mas ela acabou necessariamente por sabê-lo.
Este salto da Alexandrina teve para ela graves consequências, visto ser o ponto de partida do seu acamamento para sempre.
«Pouco depois — explica ela —, comecei a sofrer mais e toda a gente dizia que foi do salto que dei.»
Visitou vários médicos sem sucesso, tendo um deles — o Dr. João de Almeida, do Porto — dito à mãe que o mal era incurável e que a jovem iria ficar entrevada para sempre.
Continuou a ir à Missa durante algum tempo, mas com muito sacrifício e mesmo com algum receio, porque a maneira como caminhava fazia rir as pessoas que passavam por ela… Ela mesma explica:
«Chegaram a fazer caçoada de mim, do meu modo de andar, da posição que tinha na igreja…, mas eu não podia estar doutra forma.»
Estamos agora longe daquela menina que era travessa e só pensava em fazer marotices à irmã e as amigas…
Uma nova Alexandrina vai nascer na sequência deste incidente grave, uma Alexandrina que em breve se vai oferecer ao Senhor e tornar-se uma alma-vítima, uma santa de Deus à qual podemos e devemos mesmo recorrer.
Afonso Rocha

sexta-feira, outubro 25, 2019

UM MAU PATRÃO


O mal vem algumas vezes de onde menos se espera!


Como anteriormente disse, a Alexandrina começou a trabalhar muito cedo nos campos, para ganhar o pão de cada dia.

Eis como ela o conta:
Minha mãe pôs-me a servir em casa de um vizinho, mas, ao ajustar-me, tirou certas condições, como: confessar-me todos os meses, passar as tardes dos domingos em casa, para ir à igreja e estar sob o domínio dela, não andar de noite, etc. A combinação foi de cinco anos, mas não estive até ao fim.
Este patrão era um verdadeiro carrasco… pior do que isso era um homem porco e nojento que nada respeitava. Era um homem no género daqueles que no Norte dizem só gostar de “prostitutas e vinho verde”.
A sua malvadez levava-o a fazer trabalhar a jovem mais do que permitiam as suas forças e não hesitava em chamar-lhe nomes feios, a humilha-lha publicamente. A Alexandrina escreveu na sua Autobiografia que “tinha mau génio e pouca paciência e que mesmo os animais tinham medo dele porque lhes batia e era quase impossível juntar o gado quando ele estava presente”.
Alexandrina não se sentia bem com este ambiente difícil e sentia-se triste naquele trabalho, como ela mesma o escreveu.
Um dia fui à azenha levar a fornada, mas era já noitinha quando lá cheguei e, portanto, muito tarde quando regressei a casa, pois gastava no caminho uma hora. Depois que cheguei a casa, ralhou-me muito, insultou-me e até me chamou ladra. O pai dele, homem velhinho, revoltou-se contra ele, defendeu-me, dizendo que eu não tinha tido tempo para mais.
Mas o pior estava para acontecer. A Alexandrina descreve assim este caso particular e quase incrível:
Uma vez estive das dez horas da noite às quatro da manhã na Póvoa de Varzim a tomar conta de quatro juntas de bois, porque o patrão e um seu amigo ausentaram-se de mim; e eu, cheia de medo, lá passei aquelas horas tristíssimas da noite. Enquanto vigiava o gado, ia contemplando as estrelas que brilhavam muito e serviam de minhas companheiras.
Aqueles dois homens, deixando a pobre moça, alta noite já, foram para as casas de vício que nesse tempo existiam, satisfazer os seus baixos instintos, preocupando-se pouco com o poderia ter acontecido aquela jovem.
Esta foi portanto a gota que fez transbordar o vaso.
A Alexandrina queixou-se à mãe que, depois de se ter informado da realidade dos factos retirou a filha daquela triste casa e daquele trabalho de escravagem.
Minha mãe — conta a Alexandrina —, vendo que ele não cumpria o contrato, tirou-me de servir.
Este homem e dois outros vão voltar à vida da Alexandrina, alguns anos mais tarde e serão os causadores da sua enfermidade na coluna vertebral. Mais tarde ainda, ele voltará ao ataque, mas desta vez será Nossa Senhora que protegerá a Alexandrina duma maneira quase visível, o que vos contarei numa das próximas emissões.
Afonso Rocha

segunda-feira, outubro 21, 2019

CONFISSÃO GERAL


A beata Alexandrina na Rádio “Voz dos Açores”

Amigos auditores, saúde e paz. 
Na última emissão anunciei-vos que iria falar da primeira confissão geral da Alexandrina.
Frei Manuel das Chagas. Foi ele que ouviu a “confissão geral” da pequenina Alexandrina.
É legítimo pensar que ele deva ter sorrido!
Esta aconteceu em Gondifelos, pequena aldeia a 4 km de Balasar.
Como ela conta na sua Autobiografia, ela foi para lá de manhã, com a irmã e uma prima, porque as confissões eram de manhã e de tarde haveria sermão confiado a Frei Manuel das Chagas.
Este frade franciscano gozava de grande renome em Portugal, sobretudo no Norte, onde pregava muitos tríduos. São-lhe atribuídos cerca de 5000 sermões, o que demonstra largamente a sua popularidade.
Esteve exilado na vizinha Espanha durante os primeiros anos da República e da fúria anti-religiosa do Dr. Afonso Costa, ministro dos cultos, como é sabido de todos.
As três moças confessaram-se ao bom frade e permaneceram na igreja, para guardarem lugar e nem vieram para o adro brincar, o que seria normal para as suas idades.
Mas deixemos que a Alexandrina nos conte:
Foi aos nove anos — portanto em 1913 — que fiz pela primeira vez a minha confissão geral e foi com o Sr. P.e Manuel das Chagas. Fomos, a Deolinda, eu e a minha prima Olívia, a Gondifelos, onde Sua Reverência se encontrava, e lá nos confessámos todas três. Levámos merenda e ficámos para de tarde, à espera do sermão. Esperámos algumas horas e recorda-me que não saímos da igreja para brincar.
Naquela tarde a pequena igreja de Gondifelos iria estar cheia a deitar por fora, por isso mesmo as três meninas tomaram precauções… Vejamos:
Tomámos nosso lugar junto do altar do Sagrado Coração de Jesus e eu pus os meus soquinhos — galochas, como se diria nos Açores — dentro das grades do altar.
Agora só era preciso ter paciência e esperar pelo sermão, algumas horas mais tarde.
A pregação dessa tarde foi sobre o inferno — explica a Alexandrina. Escutei com muita atenção todas as palavras de Sua Reverência, mas, a certa altura, ele convidou-nos a ir ao inferno em espírito. Para mim mesma disse: «Ao inferno é que eu não vou! Quando todos se dirigirem para lá, eu vou-me embora!», e tratei de pegar nos soquinhos. Como não vi ninguém sair, fiquei também, não largando mais os soquinhos.
Santa inocência!
E portanto, como mais tarde veremos, ela viverá as penas do inferno, depois de ter vivido as do purgatório.
Depois deste sermão “medonho”, elas voltaram para Balasar e cada uma continuou as actividades que lhes incumbiam.
A Alexandrina apaixonou-se pelos pobrezinhos e nunca veio um deles bater à porta da família Costa, que não recebesse uma fatia de pão ou qualquer outro alimento ou até agasalho de que dispusessem as três mulheres.
– Era muito amiga dos velhinhos, pobrezinhos e enfermos — escreveu a Alexandrina — e, quando sabia que alguém não tinha roupinha para se vestir, pedia-a a minha mãe e ia levar-lha, ficando por vezes a fazer-lhe companhia.
Assim são os Santos de Deus.
Paz e bem e até à próxima emissão.
Afonso Rocha

PRIMEIRA COMUNHÃO E CRISMA


A beata Alexandrina na Rádio “Voz dos Açores”

Amigos auditores bom dia, boa tarde ou boa noite conforme a hora em que sintonizam esta emissão.
Na última falei-vos da meninice da Alexandrina, das suas marotices…
Mas algo mais – e de grande importância – se passou em 1911, durante a sua estadia na Póvoa de Varzim: a sua Primeira Comunhão e a Confirmação, das quais ela nos fala nestes termos:

PRIMEIRA COMUNHÃO

Padre Alvaro de Matos que deu a Primeira Comunhão à Alexandria
– Foi na Póvoa de Varzim que fiz a minha Primeira Comunhão, com sete anos de idade. Foi o Senhor P.e Álvaro Matos quem me perguntou a doutrina, me confessou e me deu pela primeira vez a Sagrada Comunhão. Quando comunguei, estava de joelhos, apesar de pequenina, e fitei a Sagrada Hóstia que ia receber de tal maneira que me ficou tão gravada na alma, parecendo-me unir a Jesus para nunca mais me separar d’Ele. Parece que me prendeu o coração.
***

CONFIRMAÇÃO

O Sacramento da confirmação ela o recebeu na então pequena cidade de Vila do Conde, distante de 3 km da Póvoa. Ela conta: 
– Foi em Vila do Conde onde recebi o Sacramento da Confirmação, ministrado pelo Senhor Bispo do Porto – Dom António Barbosa Leão.
Lembro-me muito bem desta cerimónia e recebi-a com toda a consolação. No momento em que fui crismada, não sei o que senti em mim; pareceu-me ser uma graça sobrenatural que me transformou e me uniu cada vez mais a Nosso Senhor.
Pouco depois, como já dito, as duas irmãs voltaram para Balasar.
A Deolinda começou a tirar o curso de costureira e a Alexandrina começou a trabalhar nos campos.
Mas a religião e a caridade continuavam a ocupar naquela família um lugar de honra, orquestradas pela Maria Ana, mãe daquelas meninas.
Por volta dos nove anos, já a Alexandrina sabia meditar ao observar as obras do Criador. Ouçamo-la:
– Pelos nove anos, quando me levantava cedo para ir trabalhar nos campos e quando me encontrava sozinha, punha-me a contemplar a natureza. O romper da aurora, o nascer do sol, o gorjeio das avezinhas, o murmúrio das águas entravam em mim numa contemplação profunda que quase me esquecia de que vivia no mundo. Chegava a deter os passos e ficava embebida neste pensamento, o poder de Deus!
Mais adiante, na sua Autobiografia diz ainda:
— Quando me encontrava à beira-mar, oh, como me perdia diante daquele grandeza infinita! À noite, ao contemplar o céu e as estrelas, parecia esconder-me mais ainda para admirar as belezas do Criador! Quantas vezes no meu jardinzinho, onde hoje é o meu quarto, fitava o céu, escutando o murmúrio das águas e ia contemplando cada vez mais este abismo das grandezas divinas! Tenho pena de não saber aproveitar tudo para começar nesta idade as minhas meditações.
Mas, já meditava e já guardava no seu coração puro e inocente todos estes olhares profundos sobre a grandeza de Deus e das suas obras.
E assim, entre o trabalho e a oração foi crescendo e aperfeiçoando-se, dia a dia, na espiritualidade que a levará aos cumes da mística e da união a Deus.
Na próxima emissão vos falarei da sua primeira confissão geral: é simplesmente sobrerrealista!
Afonso Rocha

domingo, outubro 13, 2019

NASCIMENTO E MENINICE DA ALEXANDRINA


A beata Alexandrina na Rádio “Voz dos Açores”
Amigos auditores, bom dia.
Na minha primeira intervenção nesta rádio, expliquei-lhes quem eu era e “confessei” quais eram os meus passatempos favoritos, precisando que aquele ao qual me entrego mais é o de tornar mais conhecida e amada a Beata Alexandrina de Balasar. Por isso mesmo vou começar hoje a falar-vos dela, esperando que o vosso interesse vá crescendo à medida que as imissões irão prosseguindo a bom ritmo.


Alexandrina Maria da Costa nasceu em Gresufes, paróquia de Balasar no dia 30 de Março de 1904, numa quarta-feira Santa e foi baptizada no sábado seguinte, portanto sábado da Aleluia.
No registo do baptismo pode-se ler que ela era filha natural de Maria Ana da Costa, também natural de Gresufes.
Esta situação merece uma explicação, sabendo-se que naquele tempo estes casos de mães solteiras eram relativamente frequentes em Portugal.
De facto, Maria Ana da Costa conheceu um jovem, também natural de Gresufes e, com promessa de casamento, deixou-se convencer e 9 meses depois — em 21 de Outubro de 1901 — nasceu a Deolinda. Nessa ocasião, o pai explicou à jovem mãe que ia para o Brasil, para ajeitar dinheiro para se casarem. E assim foi.
Voltou dois anos depois e, utilizando o mesmo estratagema, fez que a jovem ficasse de novo grávida, desta vez da Alexandrina.
Antes mesmo que a outra filha nascesse ele voltou para o Brasil, para ajeitar dinheiro para casarem…
Mesmo se a ingenuidade de Maria Ana parece grande, assim se passaram as coisas.
Dois anos depois o homem voltou do Brasil, mas não procurou Maria Ana para tratar de casamento e assumir a responsabilidade de pai…
A jovem mãe sabendo do retorno do pai de suas duas filhas, foi procura-lo à Póvoa de Varzim e viu-o com outra mulher com a qual ele casou pouco tempo depois.
Caindo em si e compreendendo que nada mais poderia esperar dele, vestiu-se de luto, como se fosse viúva, e mudou completamente de vida, dando a suas filhas uma excelente educação cristã, e tornando-se para os paroquianos um exemplo de conversão.
A sua mudança de vida foi tão evidente e surpreendente — começou a ir à missa todos os dias antes de ir para o trabalho nos campos — que o pároco de Balasar lhe confiou a chave da igreja paroquial, para que ela pudesse rezar de manhãzinha e acabou mesmo por lhe confiar a ornamentação da igreja.
Portanto destes amores ilícitos de Maria Ana e António Gonçalves Xavier, nasceram Deolinda e Alexandrina.
As duas irmãs sempre se entenderam muito bem, mesmo se Alexandrina, muito marota ao ponto de lhe chamarem “Maria-rapaz”, fizesse frequentes farsas à irmã que pacatamente aceitava e perdoava.
Cresceram as duas neste ambiente de educação sem falhas, onde a religião ocupava um lugar de honra, com a reza do terço e outras orações, todos os dias.
Os anos foram passando e, quando chegou o memento de irem para a escola, a mãe confiou-as a uma família da Póvoa de Varzim, para que ambas pudessem aprender a ler e a escrever.
Estiveram lá durante dezoito meses e ali também a Alexandrina continuou a fazer as suas marotices, agarrando-se, por exemplo aos autocarros e provocando mesmo os condutores ao ponto de fazerem queixa dela à senhora que a recebera em casa.
Desafiava os polícias que cruzava e cantava-lhes motes contra Afonso Costa…
Por um certo lado pode-se dizer que era ardil e provocadora!
Mas também tinha os seus bons momentos: ia muitas vezes para a praia da Póvoa apanhar sargaço e trazia-o à senhora que a guardava, para que esta o vendesse aos lavradores como estrume para os campos.
Fazia vénias aos sacerdotes que cruzava e beijava-lhes a mão com grande respeito e religiosidade.
Passados os 18 meses voltaram par Gresufes, para a casa materna e ali viveram algum tempo. Depois mudaram para outra casa que a mãe herdara, para um lugar chamado Calvário, nome predestinado.
Foi naquela casa que as três mulheres viveram até à morte.
Na próxima emissão irei entrar em pleno na vida da Beata Alexandrina, e contar-vos a sua juventude um tanto ou quanto movimentada.
Afonso Rocha

A BEATA ALEXANDRINA NA RÁDIO “VOZ DOS AÇORES”


QUEM SOU EU ?


Bom dia Açores !
Bom dia, auditores desta rádio.
Uma saudação muito sentida para todos os terceirenses, meus compatrícios.
O meu obrigado ao conterrâneo Euclides Álvares por me permitir estar convosco, através das condas artesianas.

Eu chamo-me Afonso Rocha.
Nasci na freguesia das Cinco Ribeiras, na ilha Terceira em 1946.
Depois de alguns estudos, não acabados, vim para França em 1964, para a cidade de Reims, onde continuo a viver, portanto há mais de 50 anos.
Aqui, conheci vários empregos que foram para mim fonte de prazer e de desenvolvimento cultural.
Os últimos 25 anos da minha vida de trabalho passeios como funcionário da Câmara Municipal de Reims.
Estou reformado desde 2011.
Sou casado, pai de três filhas, avô de 6 netos e bisavô (como o tempo passa) dum lindo menino que vive na região da Alsácia.
Como todos, também tenho os meus passatempos…
É necessário ocupar o tempo, quando se está reformado.
Quando ouvia os reformados que conhecia dizerem que agora ainda tinham menos tempo do que quando trabalhavam, eu não queria acreditar… e portanto é verdade!
Amador de futebol, como ainda novo, continuo a ver alguns jogos, ora directamente, ora via a televisão.
Mas o meu passatempo favorito — e isto desde 1985 — é fazer conhecer e amar a beata Alexandrina Maria da Costa pela qual nutro uma grande devoção.
E verdade é que prefiro falar dela do que mim, porque a minha vida é uma vida comum, portanto sem grande interesse.
Durante o meu trabalho na Câmara Municipal de Reims, escrevi um livro sobre a história local que teve 3 edições e um franco sucesso. É isto talvez a “façanha literária” mais importante que possa ter feito nesse tempo.
Agora, voltando para a Beata de Balasar, já escrevi sobre ela alguns livros, não com qualquer fim monetário — abandono os direitos de autor a uma associação — mas para que ela seja conhecida no mundo inteiro.
Para ela criei dois Sites, ambos poliglotas e uma página no Facebook que tem um bom sucesso.
Se o meu amigo Euclides desejar que eu colabore nesta rádio, será sobre este assunto que vos falarei cada semana.
Para já, um grande abraço para todos os açorianos que me escutam e, até breve, talvez, se Deus quiser.
Afonso Rocha

quarta-feira, outubro 09, 2019

A MORTE DA BEATA ALEXANDRINA


Domingo, dia 13 de Outubro de 2019, Balasar vai estar em festa… Celebra os 64 anos da morte da Beata Alexandrina.

Alexandrina Maria da Costa faleceu na paróquia de Balasar, no dia 13 de Outubro de 1955. Foi numa quinta-feira, dia da Eucaristia e aniversário da última aparição de Nossa Senhora em Fátima.


Ela tinha pedido a Jesus para morrer num dia consagrado à Eucaristia e à Mãezinha do Céu e, Jesus fez-lhe a vontade!

Vamos viver os últimos dois dias da sua vida na terra, contados pela Sãozinha, a professora da escola de Balasar e íntima amiga da Alexandrina.

«Durante a manhã de 12 de Outubro — conta ela —, dizia repetidas vezes:

“Eu queria o Céu! Eu não tenho peninha nenhuma de deixar a terra! Acabaram todas as trevas da alma! Acabaram todos os sofrimentos da alma! É sol, é vida, é tudo, é tudo, é Deus!”
A irmã perguntou-lhe: — Tu que querias?

“O Céu, porque na terra não se pode estar. Eu queria receber a Extrema-Unção, enquanto estou viva (lúcida). Vai ser muito bonito aqui. Ó Jesus, seja feita a vossa vontade e não a minha!

Neste dia, 12 de Outubro, pelas 15 horas, tendo sido autorizado, fez o seu acto de resignação à vinda do Paizinho — o Padre Mariano Pinho —. Todos de joelhos, a Alexandrina acompanhada pelo Sr. P. Alberto Gomes, recitou o seguinte acto:

“Ó Jesus Amor, ó Divino Esposo da minha alma, eu, que na vida sempre procurei dar-Vos a maior glória, quero na hora da minha morte fazer-vos um acto de resignação à vinda do meu Paizinho Espiritual; e assim, meu amado Jesus, se neste acto der maior glória à Trindade Santíssima, eu jubilosamente me submeto aos vossos eternos desígnios, renunciando à felicidade que a presença do meu Paizinho me daria, para só querer e implorar da vossa misericórdia o vosso reinado de amor, a conversão dos pecadores, a salvação dos moribundos e o alívio das almas do Purgatório”.

Imediatamente seguiu-se o acto da resignação da sua morte, assim:

“Meu Deus, como sempre vos consagrei a minha vida, vos ofereço agora o fim dela, aceitando resignada a morte, acompanhada das circunstâncias que vos derem maior glória”.

No fim destes dois actos, foi-lhe ministrada a Extrema-Unção pelo reverendo Pároco da freguesia, Padre Leopoldino Mateus. Antes de receber este Sacramento, pediu singularmente perdão à mãe, à irmã, ao confessor Sr. P. Alberto, ao Sr. Abade, ao Sr. Doutor, às primas, às pessoas amigas e à criada. Enquanto pedia perdão, disse estas frases:

“Minha mãe, perdoe-me as minhas impertinências e agradeço todos os cuidados que teve comigo”.

“Deolinda, perdoa-me. Foste uma sacrificada por mim. Agradeço tudo o que fizeste por mim”.

Ao Sr. Dr. Azevedo: “Agradeço-lhe tudo e peço-lhe perdão. Eu não o esquecerei no Céu”.

Ao Sr. Abade: “Peço-lhe perdão. A minha eterna gratidão por me trazer Nosso Senhor todos os dias. Peço que em meu nome peça perdão ao povo todo”.

“Para ti, Sãozinha, a minha gratidão eterna, que bem o mereces”.

Às pessoas que lhe tinham feito bem: Agradeço a todas as pessoas que nos fizeram bem e peço por elas no Céu.

Depois de pedir perdão, falou assim: “Já estarei com a minha alma pura para receber a Extrema-Unção?”. Foi ministrado este sacramento. Depois, foi dizendo: “Ai, Jesus, não posso mais na terra! Ai, Jesus! Ai, Jesus! A vida, o Céu custa, custa. Sofri tudo nesta vida pelas almas. Esmirrei-me, pilei-me nesta cama, até dar o meu sangue pelas almas. Perdoo a todos. Foram tormentos para meu bem. Perdoo, perdoo. Ai, Jesus, perdoai ao mundo inteiro. Ai, estou tão contente, tão contente por ir para o Céu! (Sorriu-se com os olhos no Céu). Ai, que claridade! Ai, Sr. Dr. Azevedo, que luz! É tudo luz! (Sorriu-se). As trevas, as trevas, tudo desapareceu. Bem dizia o Sr. Doutor!...”


Às 6 horas da manhã do dia 13:

Pequenos testemunhos:

“Meu Deus, meu Deus, eu amo-vos! Sou toda vossa! Tenho necessidade de partir! Não gostava de morrer de noite! Morrerei hoje?! Gostava”. (Sorria-se de um sorriso angelical).

Pediu à irmã que lhe desse a beijar o crucifixo e a Mãezinha. A irmã perguntou-lhe: Para quem te sorrias? “Para o Céu”.

Durante a manhã foi visitada por várias pessoas. Quando entrou um grupo, exclamou, assim, com voz mais forte: “Adeus, até ao Céu!”. Não pequem! O mundo não vale nada! Isto já diz tudo! Comunguem muitas vezes! Rezem o terço todos os dias!”.

Às 11 horas, disse ao Sr. Dr. Azevedo: “Está para breve”. Ele perguntou-lhe se os breves dela eram iguais aos de Nosso Senhor. E continuou: Certamente amanhã, às 3 horas, Nosso Senhor ainda lhe quer falar.

Ela sorriu-se levemente.

Às 11h25: “Eu sou muito feliz porque vou para o Céu!”

O Sr. Dr. Azevedo disse: No Céu peça muito por nós. Ela acenou que sim.

Às 11h35 pediu que lhe rezassem o ofício da agonia.

Às 17 horas, disse para um homem: “Adeus, até ao Céu!”

Às 19 horas, disse: “Vou para o Céu!”

Às 19h30, exclamou: “Vou para o Céu! A irmã retorquiu: Mas não é já. A Alexandrina respondeu: “É, é”.

Às 20h29 expirou. Conservou-se perfeitamente lúcida até ao último momento da sua existência. Assistiram à morte Mons. Mendes do Carmo, a família e pessoas amigas.»

Alguns testemunhos

— Mons. Mendes do Carmo, que assistiu à morte da Alexandrina, falou assim: Até aos 71 anos nunca beijei a mão de uma mulher, mas beijei a mão da Alexandrina.
— Um sacerdote religioso ao vê-la no caixão disse: Toda ela é um lírio branco entre os lírios.

— Passaram pela casa da Alexandrina desde que ela foi para o caixão mais de 5000 pessoas a beijar-lhe a cara, as mãos e os pés. Passavam pelo seu cadáver vários objectos religiosos, como terços, medalhas, etc.

Ao enterro assistiram alguns milhares de pessoas. No dia da sua morte, já se obtiveram graças por seu intermédio.

Maria da Conseição Leite Proença (Sãozinha)

segunda-feira, outubro 07, 2019

“GRAVA-ME COMO UM SELO NO TEU CORAÇÃO”


“GRAVA-ME COMO UM SELO NO TEU CORAÇÃO”

Esta frase que se pode ler no Cântico dos Cânticos aplica-se maravilhosamente bem à Beata Alexandrina que, bem nova ainda se consagrou a Deus e a Ele se ofereceu para ser vítima pelos pecadores, porque o seu amor era “forte como a morte”. Por isso mesmo, também ela poderia dizer desse amor, que “os seus ardores são setas de fogo, chamas do Senhor”.


Na sua autobiografia, podemos ler o que ela escreveu sobre esta acto heróico:

“Sem saber como, ofereci-me a Nosso Senhor como vítima, e vinha, desde há muito tempo, a pedir o amor ao sofrimento. Nosso Senhor concedeu-me tanto, tanto esta graça que hoje não trocaria a dor por tudo quanto há no mundo. Com este amor à dor, toda me consolava em oferecer a Jesus todos os meus sofrimentos. A consolação de Jesus e a salvação das almas era o que mais me preocupava”.

Mais adiante, na mesma Autobiografia, a Beata escreveu ainda:

“Meu Jesus, quero amar-Vos, quero abrasar-me toda nas chamas do Vosso amor e pedir-Vos pelos pecadores e pelas almas do Purgatório”.

Antes mesmo de ouvir aquelas três palavras que foram o lema de toda a sua vida – amar, sofrer, reparar –, já ela toda se entregava, já ela toda era oferta, já toda ela era amor e, “amor forte como a morte”! Eis porque razão ela “não trocaria a dor por tudo quanto há no mundo”, porque este sofrer era amor, “amor que arde sem se ver, ferida que dói e não se sente”, amor que nem “as águas torrenciais podem apagar”, amor que “nem os rios o podem submergir”.

Este amor brotava do coração da Beata Alexandrina e transformava-se em cântico mavioso, o cântico da esposa ao Amado, que num crescendo subtil e poético transbordava de alegria:
“Ó Jesus, eu Vos ofereço o dia e a noite, o calor e o frio, o vento, a neve, a lua, o luar, o sol, a escuridão, as estrelas do firmamento, o meu dormir, o meu sonhar, como actos de amor para os vossos Sacrários”.

“Sentada aos pés de Jesus, [ela] ouvia a sua palavra”, diz-nos o Evangelho de hoje referindo-se a Maria Madalena.

O mesmo se poderia dizer da Alexandrina, cujo único prazer era ouvir a voz do Senhor, a voz do Esposo celeste que tantas e tantas vezes a visitou, por isso mesmo se pode pensar e deduzir que a Beata Alexandrina “escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada”, porque ela sabia que “uma só coisa é necessária”: amar e que este amor se declinava para ela em amar, sofre, reparar.

Afonso Rocha

sexta-feira, outubro 04, 2019

OS SANTOS PERSEGUIDOS


Quando lemos as vidas dos Santos e Santas de Deus constatamos, quase sempre, que foram mal percebidos e sobretudo que foram perseguidos.
Isto não nos deve causar admiração porque Cristo também perseguido e mesmo condenado à morte e morte na cruz.

O Cónego Molho de Faria

Todavia os Santos tiveram opositores muito particulares: o próprio clero e a Igreja nossa Mãe.
Poderia citar uma ladainha dos Santos e Santas que foram perseguidos pelo clero, antes de serem colocados nos altares pelo mesmo clero e, algumas vezes pelo mesmo clero que alguns anos antes os tinham perseguido ferozmente. Apenas citarei dois deles:
S. João da Cruz, perseguido e molestado pelos próprios Carmelitas;
S. Pio de Pietrelcina, capuchino italiano que sofreu durante muitos anos a perseguição, não só dos seus próprios colegas, mas também por parte de Bispos, para quem ela era um quebra-cabeças.

Mais perto de nós temos o caso da Beata Alexandrina.

Primeiramente, por causa de ditos e mexericos orquestrados pelo Jesuíta Padre Agostinho Veloso, perdeu o seu primeiro director espiritual, o Padre Mariano Pinho.
Mais tarde perdeu também o seu segundo director espiritual, o Padre Humberto Pasquale, por este ter tomado posição contra a comissão de inquérito, mandatada pelo Arcebispo de Braga e que emitira um juízo desfavorável, dizendo que nada havia de sobrenatural na vida da “Doentinha de Balasar”.
Esta comissão nomeada pelo Arcebispo de Braga tinha à sua frente o Cónego Molho de Faria, que nunca interrogou a Alexandrina.
Sim, veio uma vez visitá-la mas unicamente para a ameaçar:

— “Lembra-te, Alexandrina, que o teu caso está nas minhas mãos.”

— “O meu caso, Sr. Cónego, está nas mãos de Deus”, respondeu ela gentilmente.»

Na declaração final da dita Comissão, escrita pelo Arcebispo, podemos ler na alínea A o seguinte:

a) que se faça silêncio sobre os pretensos factos extraordinários atribuídos à referida doente ou de que ela se afirma protagonista, os quais não devem ser expostos nem apreciados em público, mas confinar-se quando muito ao âmbito restritamente privado.

Surrealista!

O Sr. Arcebispo de Braga — Dom António Bento Martins Júnior — tinha assinado pouco antes o pedido de Consagração do mundo ao Coração Imaculado de Maria, sabendo pertinazmente que este pedido tinha origem em Balasar, portanto na Alexandrina.
Esta posição do Arcebispo Primaz teve outras consequências: influenciou outros Bispos que também tomaram posição contra a Alexandrina, como por exemplo o Bispo de Aveiro que publicou uma nota pastoral, para ser lida em todas as igrejas da sua diocese, proibindo quaisquer visitas à “Doentinha de Balasar”, o que causou a esta uma grande pena.
Convém dizer e até mesmo afirmar que a Igreja deve mostrar-se prudente nestes casos, porque, como disse Jesus, no meio do trigo também se encontra o joio, no entanto há posições tomadas que mais parecem vindas da antiga inquisição e que pouco têm de caridade cristã.
Estas informações nada têm de azedume contra a Igreja da qual me sinto plenamente filho e o serei até à morte, mas era necessário dizê-lo, que mais não seja para que se conheça esta faceta da vida da Beata Alexandrina.
O mesmo Arcebispo de Braga, pouco após a morte de Alexandrina, veio celebrar uma missa a Balasar e falou dela em termos que mostravam a sua retractação quanto ao conteúdo da declaração publicada alguns anos antes.
Quanto ao Cónego Molho de Faria, ele foi uma das testemunhas no processo informativo diocesano para a beatificação e canonização de Alexandrina e nessa ocasião mostrou o seu arrependimento e o seu desejo — que pareceu sincero — de a ver sobre os altares de Portugal e do mundo.
Mais vale tarde do que nunca!

Afonso Rocha

quinta-feira, outubro 03, 2019

A MÃE DA BEATA ALEXANDRINA


Maria Ana, filha mais velha de José António da Costa e de Ana Joaquina Leitãoera uma bela moça alegre e trabalhadeira. Nasceu a 22 de Janeiro de 1877, em Grezufes, um dos muitos lugares de que se compõe a aldeia de Balasar. Teve 4 irmãos e 5 irmãs.


Para memória, aqui fica o seu “assento” de baptismo:

«Aos 24 dias do mês de Janeiro do ano de 1877, nesta Igreja Paroquial de Santa Eulália de Balasar, concelho da Póvoa de Varzim, Diocese de Braga, baptizei solenemente um indivíduo do sexo feminino, a quem dei o nome de Maria e que nasceu nesta freguesia às cinco horas da manhã do dia 22 do mesmo mês e ano, filha legítima de José António da Costa, lavrador, natural desta mesma freguesia, e de Ana Joaquina Leitão, lavradora, natural da freguesia de Minhotães, concelho de Barcelos, desta mesma diocese, e na mesma recebidos, e paroquianos e moradores no lugar de Gresufes desta freguesia de Balasar, neta paterna de Manuel António da Costa e de Joaquina Maria de Freitas e materna de Francisco Manuel de Araújo e de Maria Joaquina Leitão. Foi padrinho Manuel António da Costa e madrinha Maria Joaquina Leitão, lavradores, os quais todos sei serem os próprios.
E para constar lavrei em duplicado este assento que, depois de ser lido e conferido perante os padrinhos, comigo o assinou o padrinho, não assinando a madrinha por não saber escrever.
Era ut supra.
O Padrinho – Manuel António da Costa
O Reitor – António Martins de Faria»

Na sua juventude apaixonou-se por António Gonçalves Xavier, de Vila Pouca, lugar da freguesia, vizinho de Gresufes.
O Professor José Ferreira explica:

«Maria Ana da Costa conhecia com certeza António Xavier desde a infância, pois Vila Pouca e Gresufes são pegados e as casas dos pais dos dois não distavam mais de 300 metros. O que fizeram nas termas foi sem dúvida estreitar uma relação que antes era só de vizinhança.»

Desta paixão — que era, sem qualquer dúvida, sincera por parte de Maria Ana — nasceu uma primeira filha, a Deolinda, em 21 de Outubro de 1901. Maria Ana tinha então 24 anos.
Naqueles tempos, por razões diversas que não cabe aqui explicar, eram numerosas as mães solteiras, por isso mesmo não deu grande alarido na freguesia que isso tivesse acontecido com aquela jovem camponesa.
Passou-se algum tempo sem que o prometido casamento se realizasse. António Xavier tinha outras ideias: ir para o Brasil ganhar o dinheiro necessário para sustentar a futura esposa e a filha. E assim o fez.
No seu depoimento, a quando do processo diocesano para a beatificação e canonização da Alexandrina, a Deolinda explicou:

«Da minha mãe tive as informações sobre o meu pai que agora exponho.
Era um aventureiro: foi várias vezes ao Brasil. A minha mãe tinha ido para as Termas do Gerês, para cura, e foi lá que o conheceu.»

E mais adiante, diz ainda:

«Voltou do Brasil quando eu já tinha os meus dois anos e começou a andar de novo atrás da minha mãe. Mas como a família (dela) se opunha, ela disse-lhe claramente que naquelas condições não podia casar… Então ele apresentou-se à minha avó e ao meu tio Joaquim e combinou o matrimónio: estavam já a procurar casa quando ele teve de ir para a Póvoa para se curar duma doença contraída no Brasil…
Um dia que a minha mãe tinha ido a Vila do Conde vender hortaliça, no regresso passou pela Póvoa onde tinha marcado um encontro com ele para o informar de que estava novamente grávida (nascerá a Alexandrina). Mas da casa donde tinha saído o meu pai saiu também uma mulher que lhe disse: – Xavier, as minhas tesouras não estarão no teu quarto?
A minha mãe teve assim a confirmação das vozes que já corriam. Xavier protestou que eram tagarelices. Mas na verdade em pouco tempo casou com aquela mulher da Póvoa.
A minha mãe chorou lágrimas amargas e desde então, por toda a vida, vestiu-se quase sempre como uma viúva e dedicou-se exclusivamente à educação das duas filhas…»

Aquela que mais tarde será muitas vezes a “secretária” da Alexandrina, deixou-nos de Maria Ana este testemunho:

«A mãe da Alexandrina reparou de modo edificante os erros da sua juventude. Ou melhor, com a caridade para com todas as pessoas, que a conheciam como mulher de grande coração; depois com uma vida de intensa piedade. Levantava-se cedíssimo. Todos os dias pelas 5 da manhã entrava na igreja, de que tinha a chave. Quando começava a Santa Missa, ela já há duas horas estava de joelhos frente ao Santíssimo. Assim fez enquanto as forças lho consentiram.»

Depois daqueles desaires e respectivas consequências, Maria Ana, sinceramente arrependida da sua conduta, mudou completamente, tornando-se mesmo um exemplo para todos, porque a partir daí manteve “uma conduta irrepreensível”.
Deolinda, falando de sua mãe, presta-lhe esta simples e sincera homenagem:

«A minha mãe ensinou-nos a trabalhar desde pequenas. A sua caridade era conhecida de todos, tanto que o pároco de então disse: – Quando esta senhora morrer, senti-lo-á toda a paróquia. – De facto não havia doente que ela não socorresse. Vinham chamá-la até de noite e ela acorria porque sentia pena. Assistia os moribundos; recitava as orações da agonia; vestia os mortos. Mais, sendo uma boa cozinheira, era chamada per os jantares nos baptizados e nas bodas, como também na residência por ocasião de pregações.»

Na sua autobiografia a Alexandrina fala-nos da sua primeira “teimosia”, que teve resultados pouco lisonjeiros:

«Como era desinquieta e, enquanto minha mãe descansava um pouco, tendo-me deitado junto dela, eu não quis dormir e, levantando-me, subi à parte de cima da cama para chegar a uma malga que continha gordura de aplicar no cabelo – conforme era uso da terra – e, por ter visto alguém fazê-lo, principiei também a aplicá-la nos meus cabelos. Minha mãe deu por isso, falou-me e eu assustei-me. Com o susto, deitei a malga ao chão, caí em cima dela e feri-me muito no rosto. Foi preciso recorrer imediatamente ao médico que, vendo o meu estado, recusou-se a tratar-me, julgando-se incapaz. Minha mãe levou-me a Viatodos, a um farmacêutico de grande fama, que me tratou, embora com muito custo, porque foi preciso coser a cara por três vezes e levou bastante tempo a cicatrizar a ferida.»

No mesmo documento, e com muita ternura a Alexandrina conta a oferta que a mãe lhe fizera: os primeiros soquinhos:

«Uma vez minha mãe deu-me uns soquinhos. Eu fiquei tão contente com eles, porque eram lindos!... Para ver a figura que fazia com eles, preparei-me como se fosse à Missa, calcei-os e depois ajoelhei-me, pondo-os à minha frente, fingindo que estava na igreja. Como era vaidosa!»

Com o mesmo carinho, Alexandrina lembra-se do que lhe dizia a mãe, quando na sua meninice se mostrava irrequieta e tumultuosa:

«Minha mãe dizia: “Os fidalgos têm um bobo para os fazer rir e eu não sou fidalga, mas também tenho quem me esteja a fazer festa”».

Mas Maria Ana tinha punho de ferro e era exigente para com as filhas: deu-lhes uma boa educação religiosa e inculcou-lhes duas grandes virtudes que tanto a uma como a outra, ficaram bem registadas nos seus corações juvenis: a caridade e o amor ao trabalho.
No que toca aos carismas de sua filha, ela sempre se mostrou recatada, quase alheia a eles, ou porque não os compreendesse bem, não os avaliando ao seu justo valor, ou então para deixar que livremente Deus actuasse na Alexandrina, segundo a Sua santíssima Vontade.
Maria Ana faleceu pouco mais de 5 anos após a Alexandrina, em 24 de Janeiro de 1961, e foi sepultada na campa da família, no Cemitério de Balasar, junto de seu irmão Joaquim Costa, que a precedeu na Mansão celeste.

Afonso Rocha