A Beata Alexandrina, nos primeiros anos da sua vida mística,
viveu no seu quartinho quase sozinha: apenas a família e alguns amigos estavam
ao corrente do seu estado de vítima voluntária para a salvação dos pecadores.
Mas, pouco a pouco, a sua fama de santidade foi-se
espelhando pelas freguesias vizinhas e depois ao Norte de Portugal e finalmente
a Portugal de Norte a Sul e mesmo no estrangeiro.
No princípio a que mais de perto lidou com ela foi sua irmã
Deolinda que se ocupava carinhosamente da sua toilette e depois, quando as
locuções interiores começaram, de escrever o que Alexandrina lhe ditava.
De facto, derivado à doença, a Doentinha de Balasar tinha
dificuldades em segurar a caneta em suas mãos o que levou a Deolinda a
tornar-se a sua “secretária”, a mais da sua primeira confidente.
Esta irmã, cuja caridade foi, exemplar, recusou casar-se
para poder ocupar-se da irmã, o que constitui sem qualquer dúvida um acto
corajoso e louvável.
Depois, quando a fama da Alexandrina passou além fronteiras
da freguesia, era também a Deolinda que se ocupava das visitas. Se elas eram
poucas no princípio, não se pode dizer o mesmo mais tarde, porque chegaram a
passar no quarto da Beata mais de 6000 pessoas, em grupos, num só dia.
A todos estes visitantes ela dirigia palavras carinhosas e
ensinamentos que a muitas e muitos fizeram mudar de vida.
A um grupo numeroso, antes que todos voltassem a casa, ela
dirigiu estas palavras cheias de ensinamentos:
«Antes que todos se
retirem, quero dizer-vos algumas palavras:
— Que esses
olhares curiosos, fixando todos um só olhar, que todas as pessoas que me
escutam, tirem algum proveito do meu martírio para as suas almas. É a razão que
me leva a imolar-me; é a razão que me leva a sacrificar-me; é a razão que me
leva a aceitar de Jesus tudo o que ele me quer dar — todo o sofrimento que
Nosso Senhor me quer enviar — eu sempre aceito tudo.»
Depois, estas palavras onde ela lembra o que se dizia dela
em algumas regiões. Ela não se queixa, mas serve-se delas como um exemplo, como
um meio de sofrimento que ela oferece:
«Quereis afastar a
justiça de Nosso Senhor?
Oh! então
despachai-vos, arrepiai caminho, fazei penitência pelos vossos pecados e mudai
de vida. Infelizmente, não sou uma santa, mas tenho a obrigação de ser. Vós
também tendes essa obrigação, porque Nosso Senhor nos convida à santidade.
Pouco me importa que me chamem bruxa — e é verdade que alguém me chama assim —
pouco me importa que me considerem uma hipócrita. Isso também não me importa.
Quanto sofreu Nosso
Senhor? O que não foi dito sobre Ele? E, apesar disso, calou-se; cristãos,
calou-se! Infelizmente, eu não me calo como Nosso Senhor se calou, eu me
insurjo sempre, me levanto, o meu ego rebela-se, de vez em quando, mostrando o
que eu realmente sou. Mas, eu gostaria de ser uma bruxa, uma bruxa para Jesus.
Isso é o que gostaria de ser.»
E prossegue com a mesma fuga:
«Para quê? Para quê?
Mas para vos
enfeitiçar a todos, para vos dar a Jesus, porque é a Jesus que eu quero
procurar toda a alegria; é por Jesus que eu amo todas as vossas almas. Muitos
dos que estão aqui, eu não os conhecia, mas já os amava, já estava sofrendo e
rezando por eles.»
E, quase ao terminar o seu longo “sermão” — que muitos
sacerdotes gostariam de ter feito — ela diz ainda:
«Eu tinha dito a
todos: “Aproveitai do que ouvistes, que as minhas palavras — ditas com tanto
sacrifício — caiam sobre os vossos corações e fiquem impressas em letras de
fogo; que elas jamais se apaguem...
Amai Jesus e a
Mãezinha! Amai Jesus e a Mãezinha! Amai Jesus e a Mãezinha!
O meu coração está
cheio dele e os meus lábios só falam do que o meu coração está cheio! Amai
Jesus! Aquele que ama não ofende a Deus, e aquele que não ofende a Deus também
não ofende ao seu próximo.
Jesus tinha dita à Alexandrina que ela viveria a sua vida
pública e, de facto, quando o Arcebispo de Braga levantou a proibição de a
visitarem, começou então esta “vida pública” com milhares e milhares de
visitantes, sendo muitas vezes necessária a presença da polícia para canalizar
o povo e evitar desordens.
Este “sermão” da beata Alexandrina de que falei encontra-se
transcrito num dos livros que escrevi sobre ela e que se intitula “Flor
eucarística”.
Afonso Rocha
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