Balasar, 1 de Fevereiro de 1939
Viva Jesus
Meu Paizinho,
Só quando quase de todo eu não puder falar é
que deixarei de ditar umas palavrinhas ao meu Paizinho. Já estou de novo
ressuscitada. Já estou melhor um pouquinho. A febre baixou: já não vomito.
Não será por muito tempo: os jeitos são disso
mas será até quando o meu Jesus quiser. Eu só quero o que Ele quiser. Mas oh!
quanto eu sofro, só Ele conhece. Nunca julguei poder sofrer assim. Eu
oferecia-Lhe tudo, tudo. Como eu gostava de Lhe fazer companhia de noite assim
doentinha. Mas afigurava-se-me que Ele não aceitava nada e eu que não estava
com Ele, que não Lhe fazia companhia nos seus sacrários. Eu tão doentinha e
ver-me em tais trevas e aridez. Parece-me que o meu querido Jesus e a querida
Mãezinha se aborrecem de mim. Não me podem suportar, viram-me as costas. Os
abismos são medonhos. Verdadeiramente, o que neles se passa só digo ao meu
Paizinho pessoalmente. Quanto Jesus sofre! Que ingratidão! E a minha alma sofre
tanto com pena de Jesus. Tanto O queria consolar! O meu coração parece que se
esmigalha. Ai, como eu queria amá-Lo e sinto que não amo nada, nada, pobre de
mim. Ai, meu Paizinho que fome eu tenho do meu Jesus. A vida é tão penosa para
esta pobrezinha. Como hei-de viver assim? Parece-me que não há abandono
comparado ao meu. Ninguém se compadece de mim. A minha miséria é a maior de
todas as misérias. Sinto uma tristeza tão profunda! Sinto-me tão envergonhada e
confundida diante de Nosso Senhor! O meu Deus, no meio de tanta miséria, estar
em mim, operar em mim tantas coisas, dizer-me palavras tão lindas! Mas a quem
as diz? Quem sou eu? A mais indigna filhinha de Jesus. Todas as coisas da minha
vida me atormentam e me fazem encher de dúvidas. Como é que Nosso Senhor não
tem nojo de estar em mim. Quase me parece impossível Ele não ter nojo e não
fugir espavorido para sempre.
Meu Paizinho, o demónio continua com toda a
raiva sobre nós. Entre mais coisas que não digo por escrito, diz-me esta: que o
Santo Padre, depois de morto, se levantará a dizer que está condenado por ter
acreditado em mim e ter consagrado o mundo a Nossa Senhora. E que eu estou
condenada por os ter enganado.
Ontem e hoje estou a jejuar. O meu Jesus não
me falou. Mas preveniu-me. Disse-me que me deixava entregue à tremenda luta,
que era para eu sofrer mais e assim ajudar a meu Paizinho. Que lhe dissesse que
não se cansa de pregar e fazer pregar penitência, penitência, penitência.
Ai do mundo? A que ponto chegou a malícia? Ai
dele se não se converte?
Meu Paizinho, só lhe cito estas palavras das
muitas que Nosso Senhor me disse. Depois o meu Paizinho verá tudo. Não posso
falar mais. Nem sei para onde hei-de voltar a escrever até ao dia do meu
Paizinho aqui vir. Ainda tenho tanto que esperar!
Lembranças da minha mãe, da Deolinda e da Çãozinha.
Eu fiquei muito amiga com o Senhor Cónego
Vilar, depois contarei ao meu Paizinho. Abençoe e perdoe a pobre Alexandrina.
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