Balasar, 7 de Janeiro de 1939
Viva Jesus!
Meu Paizinho,
Já ontem era para lhe ditar umas palavrinhas,
porque sentia necessidade de o fazer. Mas custava-me tanto a falar, estava tão
mal disposta! Mas não esperei por melhor dia. Ai, meu Paizinho, quanto esta
pobrezinha sofre. Eu queria esconder-me por completo e não queria que o meu
nome fosse falado nem enquanto viva, nem depois de morta. Queria que se
procedesse como se eu não tivesse vindo ao mundo. Claro está, não sou eu que
quero, é a tribulação que me consome.
Não mereço ser falada, sou digna de desprezo.
Vivo numa tristeza e noite contínuas. Trevas, trevas, ó que trevas. Vejo isto a
grande distância. É escuro, é medonho, o caminho que tenho que seguir. Nem ao
menos uma pequena luz para me guiar. Por vezes parece que rebento com o peso
que vem sobre mim. Oh! como me faz sofrer!
Faz-me sofrer também, não caibo em mim, parece
que me faz rebentar, as ânsias do meu Jesus. Ai, meu Paizinho, como eu queria
amar o meu Jesus. Ele é digno de todo o amor.
Eu sofro, e sofro tanto, por me parecer que O
não amo e que não tenho que Lhe oferecer. Ai meu Jesus que há-de ser de mim.
Como eu me vejo longe de Vós. Meu Paizinho, neste mesmo instante me brada
Jesus:
— Coragem, coragem, para o sacrifício.
Não negues nada ao teu Jesus.
Momentos antes de principiar esta carta
chamava-me Ele:
— Alexandrina, meu querido amor, já que
não chamas por Mim, chamo Eu por ti. Dás-me todos os sacrifícios que te peço?
— Tudo, tudo, meu Jesus: o que eu quero é
ter que Vos dar!
— É esta vida triste e dolorosa, mas Eu
quero que vivas assim. Se soubesses em que fim aplico os teus sofrimentos! O
proveito que tiro! Mas confia que te dou força e te darei sempre que precises,
o teu Paizinho para te confortar e te guiar.
Eu lembro-me sempre do meu Jesus, mas confesso
a minha falta, não chamo por Ele com o fim de Ele me falar. Desgostarei o meu
Jesus? Ficará triste com o meu proceder? Por caridade, diga-me alguma coisa. Eu
não quero desgostá-Lo. O sofrimento da minha alma, o meu desânimo, é que me
obriga a fazer assim.
Hoje não lhe mando dizer mais nada do que o
meu Jesus me tem dito.
Tem-me falado todos os dias. E nesses momentos
sinto muita paz e não tenho dúvidas nenhumas. Mas sempre debaixo duma enorme
tristeza.
O demónio diz-me:
— Juro-te, juro-te que és tu que fazes
tudo. Andas a enganar aquele impostor, aquele f. etc... Não o enganas, sabe
muito bem a malícia que tens, os crimes que praticas. Mas convém-lhe assim.
Ai, meu Paizinho, como as dúvidas me afligem.
Como eu tenho medo de enganar e eu não queria enganar ninguém.
Amanhã é sexta-feira, já sinto medo. Por
caridade, não me esqueça junto do meu Jesus.
Lembranças da minha mãe, de Deolinda e da Çãozinha.
E para esta pobrezinha, a bênção e perdão, Alexandrina.
P. S. Peço o favor de me recomendar muito aos
Senhores Padres que aqui têm vindo.
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