Na última conferência falei-vos da partida do Padre Mariano Pinho —
primeiro director espiritual da Beata Alexandrina — para o exílio, no Brasil.
Ora, é bem sabido que Deus nunca fecha uma porta que não abra outra.
No dia 21 de Junho de 1944, por convite insistente de pessoas movidas de
compaixão pelo abandono em que a Alexandrina tinha sido deixada (…) chegou a
Balasar um religioso Salesiano, o Padre Humberto Pasquale, apenas dois anos
mais novo que a Alexandrina.
Como deixou escrito, foi o Dr. Augusto de Azevedo, o médico da “Doentinha
de Balasar” que lá o conduziu no seu carro.
Como também confessou o Padre Humberto, pouco conhecia, nesse tempo, de
ascética e mística: apenas os rudimentos ensinados então nos Seminários.
Também não se quis informar sobre aquela que ia visitar, preferindo o
efeito de surpresa, para poder depois ajuizar, em sua alma e consciência, o que
fazer, visto lhe terem pedido simplesmente de levar um pouco de reconforto
àquela alma que parecia agora abandonada de todos.
As línguas do mundo tinham gasto muita saliva!
De facto, tendo estado em pregação em aldeias próximas de Balasar, tinha
ouvido falar da Alexandrina e não sempre em bem, por isso mesmo ainda mais foi
espicaçada a sua curiosidade e quis ver ele mesmo o porquê de tantos boatos
discordantes, alguns deles pouco lisonjeiros.
Mas falemos agora um pouco deste sacerdote que vai ter um papel muito
importante não só na vida da Alexandrina, mas até depois da morte desta, visto
ter sido ele escolhido mais tarde para organizar o Processo diocesano para a
Beatificação e canonização da Alexandrina.
O Padre Humberto Maria Pasquale, salesiano de Dom Bosco, foi enviado para
Portugal em 1933, ainda seminarista, para reorganizar as casas salesianas que
nesse tempo existiam já em terra lusitana.
Foi ordenado sacerdote em 21 de Dezembro
de 1935 pelo Cardeal Cerejeira, patriarca de Lisboa.
Em 1937, foi nomeado Mestre dos Noviços,
e pouco depois abriu uma nova Casa em Mogofores, onde iriam ser mais tarde dactilografados
todos os documentos referentes à Alexandrina: Sentimentos da alma, Pensamentos
esparsos, Cartas ao Padre Mariano Pinho, Autobiografia, etc..
O Padre Humberto foi grande amigo da
Irmã Lúcia de Fátima, com a qual manteve uma correspondência regular e a qual
visitou diversas vezes em Coimbra.
Sobre o primeiro encontro com a Alexandrina, ele mesmo escreve, utilizando
a terceira pessoa:
“As coisas passaram-se assim: o Religioso, nos dois dias em que lá esteve
hospedado, compreendeu que naquela alma se passava alguma coisa de excepcional;
e que, à volta dela, existia uma série de problemas, dignos do mais sério
estudo.”
O Padre Humberto reconfortou, quanto lhe foi possível, em tão pouco tempo,
a “Doentinha de Balasar”, mas não qui tomar qualquer decisão sem um momento
mais ou menos longo de reflexão sobre um caso tão estranho: a Alexandrina já
não comia nem bebia, vivendo apenas da Eucaristia quotidiana.
Só a 8 de Setembro de 1944 o Padre Humberto tomou oficialmente a direcção
espiritual da Alexandrina. Ele irá defendê-la com “unhas e dentes”,
particularmente contra a comissão nomeado pelo Arcebispo de Braga e que tinha
emitido um aviso desfavorável. Desta defesa renhida e justificada, resultará a
obrigação exigida pelo mesmo Arcebispo, que o Padre Humberto seja reenviado
para Itália, como já antes tinha acontecido com o Padre Mariano Pinho.
O artesão destes desentendimentos tristes, foi o Cónego Molho de Faria, que
influenciado por algumas “beatas” de Balasar, tudo fez para que o salesiano
fosse afastado da direcção espiritual da Alexandrina.
Mais tarde, o mesmo Arcebispo, agora devidamente
informado e querendo, provavelmente reparar uma injustiça feita ao sacerdote
italiano, pediu a este que organizasse o processo diocesano. O bom salesiano
aceitou e o dito processo começou a 14 de Janeiro de 1967.
Durante este foram ouvidas 48 testemunhas. Apenas uma,
por motivos pouco louváveis, testemunhou contra a Alexandrina: foi o Padre e
escritor jesuíta, Agostinho Veloso.
Afonso Rocha
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