sexta-feira, junho 27, 2008

CARTAS A UM AMIGO – 02



França, 2 de Fevereiro de 2005


Meu caro José,


Fiquei surpreendido de me dizeres que tinhas lido a minha última carta aos teus amigos, a quando de uma reunião da tua Associação e que eles estão entusiasmados e desejosos de conhecer algo mais sobre a “Santinha de Balasar”.
Tu sabes bem que eu não sou escritor e que as minhas cartas nada mais têm que o desejo de informar e de mostrar que a santidade é para todos e não para alguns “privilegiados”: todos nós podemos ser santos se cumprirmos os mandamentos de Deus e mais particularmente os dois primeiros, visto que todos os outros dependem destes.
Continuando a falar do que me pediste, vou então contar-te algumas coisas da vida da Beata Alexandrina de Balasar.
Antes, todavia, como ela mesmo o fez, imploro a ajuda do divino Espírito Santo de maneira que tudo quanto terei a escrever, seja para a maior glória de Deus e o bem das almas que estas linhas irão ler. Como nada sou, nada pretendo para mim, senão para o bem da minha alma que humildemente coloco entre as Mãos de Deus, a quem toda a glória e toda a honra seja prestada por todos os séculos. Amem.
Na sua Autobiografia ― datada de 20 de Outubro de 1940 ― a Beata Alexandrina escreve:
« Nasci na freguesia de Balasar, concelho da Póvoa de Varzim, distrito do Porto, a 30 de Março de 1904, numa quarta-feira de trevas, e fui baptizada a 2 de Abril do mesmo ano, era então Sábado de Aleluia ».
A Alexandrina nasceu durante a Semana Santa, como aqui se pode ler. Um certo número de factos notáveis da sua vida ocorrerão também durante a Semana Santa, como veremos mais tarde.
« Serviram de padrinhos ― continua ela a explicar ― um tio de nome Joaquim da Costa e uma senhora de Gondifelos, Famalicão, de nome Alexandrina », razão pela qual ela mesma foi chamada Alexandrina, como era então a tradição: era a madrinha que escolhia o nome da afilhada.
Este tio de quem ela fala e que foi seu padrinho de baptismo e protector da família nos momentos difíceis que esta atravessou, foi sepultado na campa familiar, no cemitério de Balasar, onde mais tarde foram igualmente sepultadas Maria Ana, à mãe da Alexandrina e Deolinda, a irmão mais velha.
Uma das grandes virtudes da Beata foi a humildade. Aqui tens, meu amigo, um exemplo dessa virtude que ela “cultivou” no jardim da sua bela alma:
« Encontro em mim, desde a mais tenra idade, tantos, tantos defeitos, tantas, tantas maldades que, como as de hoje, me fazem tremer. Era meu desejo ver a minha vida, logo desde o princípio, cheia de encantos e de amor para com Nosso Senhor. »
Preparando-se ― depois de ter identificado ― para nos contar a sua vida, ela afirma:
« Até aos três anos de idade não me recordo de nada, a não ser de algum carinho que dos meus recebia. Com os meus três anos recebi o primeiro mimo de Nosso Senhor. »
Para que saibas, caro José, que são estes “mimos” do Senhor, dir-te-ei que esta palavra tem aqui o sentido oposto ao que ela quer na verdade dizer. Quando ela fala de “mimos” do Senhor, fala-nos de sofrimentos livremente aceites que Jesus permitia para o bem das almas.
Este primeiro “mimo” de que aqui fala refere-se a um incidente causado pela sua teimosia e desobediência ao que lhe dissera a mãe. Serviu-lhe de exemple e, daí em diante, foi mais obediente, mas mesmo assim sempre traquina. É que os santos são como toda a gente, também têm os seus defeitos, mas a vantagem deles é que sabem corrigi-los e arrepender-se... o que nem sempre é o nosso caso, amigo José.
Desde muito pequena, Alexandrina sentiu-se atraída pelo Céu. Ouçamos o que ela escrever na sua Autobiografia:
« Pelos quatro anos e meio de idade, punha-me a contemplar o céu (abóbada celeste) e perguntava aos meus se poderia chegar-lhe se pudesse colocar umas sobre as outras todas as árvores, casas, linhas dos carrinhos, cordas, etc., etc. Como me dissessem que nem assim chegaria, ficava descontente e saudosa, porque não sei o que me atraía para lá. »
Santa inocência!...
Mas não era só o Céu que a atraía: a oração também, como ela no-lo conta:
« Já nesta idade amava muito a oração, pois lembra-me que minha tia pedia-me para rezar com ela a fim de obter a sua cura. »
Lembra-te, meu amigo, que ela apenas tem quatro ou cinco anos...
Depois, como ela conta, começou a frequentar a catequese, onde depressa vai aprender o que lhe será necessário para ser mais tarde catequista.
Estas frequentes visitas à igreja paroquial, proporcionavam-lhe ocasião de vislumbre, de meditação:
« Quando me encontrava na igreja, punha-me a contemplar os santos, e os que mais encantavam eram as imagens de Nossa Senhora do Rosário e S. José, porque tinham uns vestidos muito bonitos e eu desejava ter uns iguais aos deles. Não sei se seria já princípio da manifestação da minha vaidade. Queria ter uns vestidos assim, porque perecia-me que ficava mais bonita com eles. »
Seria mesmo vaidade?
Penso que não e, note-se que ela mesmo o não afirmar, nada mais faz do que fazer uma pergunta. E na verdade, a Alexandrina que gostava de andar “asseadinha”, nunca foi pessoa vaidosa.
Depois de apontar os seus “defeitos” ela aponta também algumas das suas virtudes, entre as quais o seu amor a Nossa Senhora:
« E, se nesta idade manifestava os meus defeitos, também mostrava o meu amor para com a Mãe do Céu, e lembra-me com que entusiasmo cantava os versinhos a Nossa Senhora e até me recordo do primeiro cântico que entoei na igreja, que foi “Virgem pura, tua ternura, etc.” »
Começava já a despontar nela aquele amor indizível que crescerá mais ainda no que toca à nossa Mãe do Céu, que muito em breve ela começará a chamar “Mãezinha”.
Como vês, meu amigo, a vida da Alexandrina tem muito que contar e não serão apenas algumas páginas o suficiente para a descrever. Resumir uma vida tão cheia de Deus e das coisas de Deus, seria, a meu ver, traí-la. E eu não posso trair a querida Alexandrina...
Ficamos hoje por aqui, caro José. Na próxima carta te contarei mais algumas “aventuras” desta jovem extraordinária que a Igreja considerou digna das honras dos altares.
O teu amigo dedicado.


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