sexta-feira, março 30, 2012

O MEU SANGUE CORRIA…

– Jesus, aceitai o meu sacrifício!

A Beata Alexandrina en êxtase durante uma "Paixão"
Escusado é fugir, nem esconder-me; não posso, não tenho para onde. Tudo é noite. E sinto-me à porta do inferno. Ó meu Deus, que tormentos arrepiantes me esperam.
Chegou a sexta-feira, triste sexta-feira! Vi a minha cruz, vi-a ainda cedo; preparavam-na a toda a pressa. Ela era precisa, fosse qual fosse a sentença que eu recebesse. Dentro da minha alma sentia a mansidão, a bondade sem igual; dentro dela também, e ao mesmo tempo, sentia contra a mesma bondade e mansidão o ódio, o rancor, o desespero e uma autoridade orgulhosa; orgulho sem igual. Feras contra o Cordeirinho mais pequenino e inocente. Meu Deus, que dor por esse cordeirinho tão cheio de bondade! Senti essa autoridade orgulhosa ainda antes de lavrar a sentença contra o cordeiro inocente; com um furor diabólico rasgaram de cima a baixo os seus vestidos.
Ao encontro destes sofrimentos vieram os sofrimentos causados pelo demónio. Ele anda desesperado, não sei porquê, mas certamente por Jesus não ter deixado, ainda não continuou as suas manobras infernais. Veio para a minha frente em figura de fantasmas, mas de tal altura que não lhe via o princípio nem o fim. Mostrava-se muito nojento por mim. Senti-o a querer escarnecer-me dentro da boca, piores ainda, não as digo aqui, é porco, é escandaloso. Ele não se satisfaz com tudo isto; a sua raiva é por não conseguir fazer o que tantas vezes tem feito.
– Jesus, aceitai o meu sacrifício, custa-me tanto falar; é obediência, santa obediência; se não fosses tu, sofria sozinha, em silêncio, só Jesus o sabia.
E hoje, dia da Mãezinha, e eu ainda sem comungar, sem receber do meu Jesus força para tanta dor, dor que desfaz, dor que rasga e volta a rasgar a minha pobre alma. Subi a montanha do calvário com tanto custo, sempre a parecer ir expirando. Clamei, clamei sem cessar:
– Pai, ó meu Pai, até tu me deixas, até tu me abandonas!
O meu sangue corria, encosta abaixo. Escondeu-se o sol, encobriu-se envergonhado de tanta malícia. E eu, envergonhada, estava na cruz, despida, à vista da canalha mais vil. Os meus vestidos foram cortados e distribuídos. A minha tristeza e amargura não cessaram. A alma tremia com dor e com medo como o corpo treme de frio. A bradar sempre por Jesus, Ele veio e trouxe com Ele um sol luminoso e abrasador. Cessaram as tremuras da alma, o medo e toda a dor; só tinha paz, só tinha luz e amor. O coração principiou a receber uma vida que não sei explicar, todo o peito se me abrasou em chamas. Que suavidade eu gozei e por muito tempo. A abóbada do céu desceu sobre mim toda ela almofadada em algodão, a qual envolvia os anjos com instrumentos. Ouvia os seus hinos maravilhosos, não os compreendia bem, mas sei que eram a Jesus Sacramentado. Ouvi as palavras Corpus Domini Jesu Christi, senti que Jesus se deu a mim e me prendeu mais e mais a Ele. Os anjos continuavam a cantar; por entre eles sobressaiu um canal fortíssimo directamente a mim, dele caíam chamas de fogo e muitas e muitas coisas, tudo entrava para mim.
(Sentimentos da alma: 2 de Fevereiro de 1945 – Sexta-feira)

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