— Ó meu Jesus, é bem doce sofrer por Vós
— Coragem,
filhinha, cá estou eu a deliciar-me na tua dor. O teu Jesus não te falta com a
sua graça e o seu conforto.
— Ó meu
Jesus, é bem doce sofrer por Vós; é bem doce o Vosso conforto, mas tudo
desaparece nas trevas, tudo passa como se não fosse para mim. Parece-me que Vós
existis só para me condenares e não para me salvares. Não há para mim mimos do
céu nem da terra; para mim tudo morreu, tudo desapareceu na negra escuridão da
noite. É sempre noite, em todo o mundo noite. Sinto todo o mundo a tremer
apavorado; lá se vai ele a mergulhar no abismo da perdição. Eu quero
acudir-lhe, quero salvá-lo e não posso. Sinto a sua perda, mas não o vejo para
o agarrar, não vejo as almas, não vejo as prisões, as trevas não me deixam. Meu
Deus, perdi a luz, perdi a vida. Pobre do meu coração em dor e em ânsias: dor
por Jesus ser ofendido, dor por as almas se perderem; ânsias de amar a Jesus,
ânsias de O ver amado, ânsias de salvar as almas. Que fogo consumidor! Sinto o
estalar do rochedo por onde o fogo vai penetrando. Mas ah! é impossível estas
chamas incendiarem tudo. E eu só enrolada, mergulhada sempre na negrura mais
aterradora. Quando mais não posso, levanto os olhos ao céu e digo:
— Meu Jesus,
sei, acredito, confio que estais em mim e sabeis que só a Vós quero amar e não
Vos quero ofender.
E, descendo para
baixo, imagino ver toda a humanidade e digo-lhe:
— Ó mundo,
quero salvar-te, por ti, pela tua entrega a Jesus, quero sofrer tudo.
Dito isto, fico
de braços caídos, como se no meu corpo não existisse gota de sangue. Nada
feito, do mundo nada consigo. A minha prece não chegou ao céu, Jesus não a
ouviu. Mas ah! tenho aqui um coração que palpita por Ele e Ele bem o sabe.
Confio, confio; é Jesus e a Mãezinha que vão vencer as minhas trevas. São Eles
que vivem, são Eles que sofrem em mim. Os ceguinhos que não têm olhos no corpo
também se salvam. Eu perdi a luz da minha alma, maior será a compaixão de
Jesus. Hei-de salvar-me e com Jesus hei-de salvar muitas almas. O demónio
rodeou-me tanto durante a noite! Não foi um, foram muitos. Assustava-me tanto
pelas formas com que se apresentavam! Um deles tinha uma tão grande e tão feia,
quase me tocava com ela. O meu corpo ficou como se fosse uma casa com janelas
por todos os lados; estas todas fechadas, mas todas rodeadas por eles. São como
feras que querem lançar-se à presa, são ladrões que querem assaltar a casa,
assassinos que querem matar quem nela habita. Que olhares tão maliciosos! Que
gestos de tanta maldade!
— Não
pecarei eu, meu Jesus? Tirais disto alguma consolação para Vós, algum proveito
para as almas? Sou a Vossa vítima, guardai para Vós o meu coração, o meu corpo
e a minha alma. Tende dó de mim, meu Jesus.
Parece-me que em
nada falei verdade. (Sentimentos da alma: 30 de Abril
de 1945)
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