Balasar, 6 de Janeiro de 1939
Viva Jesus !
Meu Paizinho,
Já ontem era para lhe ditar umas palavrinhas, porque sentia
necessidade de o fazer. Mas custava-me tanto a falar, estava tão mal disposta!
Mas não esperei por melhor dia. Ai, meu Paizinho quanto esta pobrezinha sofre.
Eu queria esconder-me por completo e não queria que o meu nome fosse falado nem
enquanto viva, nem depois de morta. Queria que se procedesse como se eu não
tivesse vindo ao mundo. Claro está não sou eu que quero, é a tribulação que me
consome.
Não mereço ser falada, sou digna de desprezo. Vivo numa
tristeza e noite contínuas. Trevas, trevas, ó que trevas. Vejo isto a grande
distância. É escuro, é medonho, o caminho que tenho que seguir. Nem ao menos
uma pequena luz para me guiar. Por vezes parece que rebento com o peso que vem
sobre mim. Oh! como me faz sofrer!
Faz-me sofrer também, não caibo em mim, parece que me faz
rebentar, as ânsias do meu Jesus. Ai, meu Paizinho, como eu queria amar o meu
Jesus. Ele é digno de todo o amor.
Eu sofro, e sofro tanto, por me parecer que O não amo e que
não tenho que Lhe oferecer. Ai meu Jesus que há-de ser de mim. Como eu me vejo
longe de Vós. Meu Paizinho, neste mesmo instante me brada Jesus: "Coragem, coragem, para o sacrifício.
Não negues nada ao teu Jesus".
Momentos antes de principiar esta carta chamava-me Ele:
"Alexandrina, meu querido amor, já que não chamas por Mim, chamo Eu por
ti. Dás-me todos os sacrifícios que te peço!" Tudo, tudo, meu Jesus: O que
eu quero é ter que Vos dar! "É esta vida triste e dolorosa, mas Eu quero
que vivas assim. Se soubesses em que fim aplico os teus sofrimentos! O proveito
que tiro! Mas confio que te dou força e te darei sempre que precises, o teu
Paizinho para te confortar e te guiar."
Eu lembro-me sempre do meu Jesus, mas confesso a minha
falta, não chamo por Ele com o fim de Ele me falar. Desgostarei o meu Jesus?
Ficará triste com o meu proceder? Por caridade, diga-me alguma coisa. Eu não
quero desgostá-Lo. O sofrimento da minha alma, o meu desânimo, é que me obriga
a fazer assim.
Hoje não lhe mando dizer mais nada do que o meu Jesus me tem
dito.
Tem-me falado todos os dias. E nesses momentos sinto muita
paz e não tenho dúvidas nenhumas. Mas sempre debaixo duma enorme tristeza.
O demónio diz-me: juro-te, juro-te que és tu que fazes tudo.
Andas a enganar aquele impostor, aquele f. etc... Não o
enganas, sabe muito bem a malícia que tens, os crimes que praticas. Mas
convém-lhe assim. Ai, meu Paizinho, como as dúvidas me afligem. Como eu tenho
medo de enganar e eu não queria enganar ninguém.
Amanhã é sexta-feira, já sinto medo. Por caridade, não me
esqueça junto do meu Jesus.
Lembranças da minha mãe, de Deolinda e da Sãozinha.
E para esta pobrezinha, a bênção e perdão
Alexandrina.
P. S. Peço o favor de me recomendar muito aos Senhores
Padres que aqui têm vindo.
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