Eu quisera, filha querida, que viesse o mundo inteiro, junto de ti
Passou-se algum tempo neste estado mortal; veio como que uma nuvem de fogo, envolveu-me nela, o coração principiou com total fogo, envolveu-me nela, o coração começou a arder com tal fogo que se comunicava ao corpo; este fogo queimava-me, mas sem me dar luz. Senti-me adormecer naquelas trevas mais claras e suaves. Não sei o tempo que passei neste sono com Jesus. Ao terminar do sono, ouvi que Ele me dizia:
― Minha filha, minha amada filha, a tua noite com o teu prolongado e inigualável Calvário são para as almas astros cintilantes, com vão com o Seu brilho penetrar nos corações e nas almas mais escurecidas pelas trevas do pecado. Confia, confia em Mim. Se soubesses a luz, que elas por ti recebem! Se soubesses os milagres, as grandes ressurreições que nelas são operadas neste teu quartinho, Calvário escolhido por Mim! O teu quarto é o templo das maravilhas prodigiosas do senhor. Eu quisera, filha querida, que viesse o mundo inteiro, o mundo que te confiei, junto de ti. São muitas as almas que vêm, mas em comparação das que precisam vir e eram Meus divinos desejos que elas viessem, é como uma gotinha de água caída do oceano. Ao ouvir estas palavras de Jesus, não pude conter-me, e exclamei:
― Então, meu Jesus, ofendi-Vos, ficaste triste comigo por eu pensar: se eu pudesse ir com os meus para uma ordem e esconder-me a isto tudo. Dizei-me, dizei-me, Jesus.
― Sossega, sossega, Minha pomba amada; não Me ofendeste, antes recebi de ti consolação. Quando assim pensares, não acrescentaste logo: meu Jesus, não quero fugir à cruz, que me dais, quero só a Vossa divina vontade? Compreendi-te; está tudo visto. Que encantadora lição; viver escondida por Mim! Olha, Minha filha; é o mundo, são os pecadores o fim principal da tua vida aqui; é a tua missão, a mais alta e sublime missão. Quando mandas abrir a porta às almas, é Cristo em ti a abrir-lhes o coração: é Cristo que lhes fala com bondade e doçura, é Cristo que lhes sorri e as fita com olhares atraentes e encantadores e as convida para o Céu. É Cristo em todo o teu viver. Que loucura a minha pelas almas! E elas, ai delas! E elas, ai delas, tão mal Me tratam, tanto Me ferem! Olha para Mim.
Apenas vi o rosto de Jesus com semblante tristíssimo; todo o Seu Santíssimo corpo, da cabeça aos pés, tinha um vestido de espinhos, tudo era sangue. Acudi logo:
― Não posso ver-Vos, Jesus, nesse sofrimento; passai-o para mim, aliviai-Vos a Vós; não me poupeis, sou criatura Vossa e Vós o meu Senhor. Para assim sofrerdes, de nada valem os meus sofrimentos.
― Ai do mundo sem eles, Minha filha, ai do mundo sem vítimas, ai dele sem o teu Calvário contínuo; já a bomba divina tinha rebentado! Que incêndio de justiça sobre o incêndio dos crimes! O mundo é teu, é teu o mundo, confiei-to; sofre pelas almas; pensa só a elas salvares. Ó mundo, ó pobre mundo, que não acordas, ai o que te espera para breve, para breve.
Quando Jesus assim me falava, todos os espinhos Dele tinham desaparecido, mas ai que dor a minha! Pobre de mim, nada soube dizer a Jesus; fitei-O e fiquei calada.
― Coragem, Minha filha! Eu vou dar-te a gota do Meu divino Sangue; vai passar para o teu coração vagarosamente; vai ser como uma esponja com água; vai passar por todo o teu coração e correr em todas as veias. É o sangue que gera as virgens, é o sangue que te dá a vida, o sangue que te levanta as forças perdidas e consumidas pela dor, é o sangue que te anima a continuares no te martírio.
Jesus, enquanto falou, introduziu o tubo e deixou passar a gotinha vagarosamente; quando acabou de falar, já o tinha desligado.
― Coragem, coragem ,filha querida; vai para a dor, vai para a cruz. Vou pedir-te grande luta com o demónio. Repara-Me pelos sacerdotes, que é tão grande o número a ofender-Me. Repara-Me pelos casados, que praticam graves crimes. Repara-Me pela juventude desonesta, pela juventude corrompida. Vai sofrer, vai para a cruz, vai com alegria, vai ditar tudo; eu serei contigo e contigo levas a luz do Espírito Santo. Goza da minha paz, goza uns momentos da minha luz.
Fiquei sem dor, fiquei sem trevas, por um pequenino espaço de tempo. Abracei Jesus no meu coração, e disse-Lhe por despedida:
― Obrigada, obrigada, meu Jesus.
(Beata Alexandrina: Sentimentos da alma, 14 de Novembro de 1947 - Sexta-feira)