Hoje, cedinho ainda, lá me foram buscar

Hoje, cedinho ainda, lá me foram buscar. Levaram-me sem piedade, e logo, com furor rancoroso, me açoitaram e coroaram de espinhos. Com o rosto coberto de escarros assim segui ao Calvário; aqui e além caía, aqui e além, parecia morrer. Novas descargas de açoites, em viagem tão penosa, caíram sobre mim. Cheguei ao cimo do Calvário com todo o desfalecimento. Fui crucificada, e, ao ser a cruz voltada para revirar os cravos, foi meu rosto no solo muito ferido, e uma golfada de sangue me veio aos lábios. Custa-me tanto falar assim! Foi Jesus, não fui eu, que assim foi ferido; mas não sei exprimir-me doutra forma. Levantada ao alto da cruz, senti que Jesus estendeu os seus olhares divinos pelo Calvário, por toda a humanidade. Com esta visão tremi e senti o corpo gelar; não eram os meus que viam, eram os de Jesus, mas com Ele em mim tudo vi e senti. A vista de tanta ingratidão fez com que Jesus levantasse para o Pai os Seus olhares divinos, cheios de compaixão e pedir perdão para os que O feriam; não pediu vingança, desculpou-os. Ficou em extrema agonia e eu com Ele. Quando Jesus expirou eu senti morrer o meu corpo e sentia que uma vida estava separada de mim, mas não me pertencia.
Estive um pedaço sem Jesus me falar; demorou a chegar, ou melhor, a fazer que eu O sentisse e ouvisse. Quando Lhe aprouve, disse-me:
― Minha filha, Minha filha, Minha filha, demorei a chegar, venho desfalecido; fui maltratado, quero refugiar-me. Dás-me entrada no teu coração?
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(Beata Alexandrina: “Sentimentos da alma”, 6 de Junho de 1947 - Sexta-feira)
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