sexta-feira, maio 28, 2021

VIVEZA DE CARÁCTER

Até me chamavam Maria-Rapaz


– Era viva e tão viva que até me chamavam Maria-Rapaz. Dominava as companheiras da minha idade e até as mais velhas do que eu. Trepava às árvores, aos muros e até preferia estes para caminhar em vez das estradas.

Gostava muito de trabalhar: arrumava a casa, acarretava a lenha e fazia outros serviços caseiros. Tinha gosto que o trabalho fosse bem feito e gostava de andar asseadinha. Também lavava roupa e, quando mais não tinha, era o meu aventalinho que trazia à cinta. Quando não sabiam de mim, era quase certo encontrarem-me a lavar num ribeiro que corria perto de casa.

Um dia, fui com a minha irmã e uma prima apascentar o gado, entre ele uma égua. A certa altura, a égua fugia para o lado do campo que estava cultivado e, como a fosse tornar, ela atirou-me ao chão, dando-me com a cabeça, e depois colocou-se sobre mim; de vez em quando raspava-me o peito com uma pata sobre o meu coração, como quem brinca. Levantava-se, relinchava e voltava a fazer o mesmo. Fez assim algumas vezes, mas não me magoou.

As minhas companheiras gritaram e acudiram várias pessoas que ficaram admiradas de eu sair ilesa da brincadeira do animal. (Alexandrina Maria da Costa: Autobiografia)

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