Se não fosse a graça do Sacramento…
Capela da Santa Cruz de Balasar |
Faltará muito para chegar ao cimo do meu Calvário? Não sei, o que sei, o que sinto é que cheguei ao auge da minha dor, dor que, sem um grande auxílio do Céu, já teria chegado ao desespero. Que dias tristes! Que dolorosa amargura! Que horas trágicas e de tanto desfalecimento! O meu olhar fixo em Jesus e na Mãezinha falavam mais do que os meus lábios; era a pedir-Lhes socorro; e juntamente ia o murmúrio do coração com um estreito abraço a tudo o que era dor.
Por Vosso amor, Jesus, por Vosso amor, Mãezinha, e pela salvação das almas. Mas com o aumento da dor e tentar esconder as minhas lágrimas pensava: se não fosse a graça do Sacramento, não queria junto de mim um sacerdote; queria-me abandonada, como de verdade eu me sinto. Queria dizer aos meus amigos que fizessem de conta que não existi no mundo; queria esconder-me de todos os olhares. Jesus basta ao meu coração, mesmo a sentir que nada O possuo. Uma tempestade fortíssima me absorvia; tempestade desastrosa, tempestade sem remédio. Fui lutando, fui chorando e dando a Jesus as minhas lágrimas; Ele foi vencendo em mim; Ele sem que eu o sentisse, levantou-me, e encaminhou-me a romper por entre as trevas: Bendito seja Deus! Valha-me o grande poder de Deus, valha-me a grande caridade de Deus, valha-me o amor imenso, o amor infinito de Deus. Assim costumo dizer, assim vou vencendo. Sinto em meu coração as grandes espadas, os grandes punhais que há oito dias me ficaram cravados; quanto mais me trespassam, quanto mais mo cortam maiores se fazem; parecem crescerem, momento a momento. Estes punhais vêm do meio do mundo; é dele que me atingem o coração; é o mundo que os move; são mãos cruéis que os obrigam a cortarem com seus fios afiadíssimos. Quando eu sofro assim, o quanto não sofrerá Jesus! Ah! Se eu pudesse atrair para mim todos os sofrimentos e não deixar que nem um só fosse ferir o Coração Divino de Jesus! Ele deu-me há dois dias um grande mimo, um mimo do Seu Divino amor. Ao recebê-lo parece que todas as amarguras me atingiram mortalmente o que fez tirar-me toda a alegria e consolação que desse mimo podia receber. Se Vós quereis assim, Meu Jesus, porque o não hei-de querer eu também! Para Vós tudo, toda a consolação e amor. Faça-se em mim a Vossa vontade divina. Este mimo passou em mim despercebido, mas deixou-me o coração forte; foi como que uma injecção que o ajudou a suportar novos golpes que o vieram ferir. Louvado seja o meu Senhor que tanto tem para me dar e tão cuidadosamente vela por mim. Se eu soubesse corresponder às graças do meu Jesus! Foi dolorosíssimo, foi amargosíssimo o meu Horto de ontem, foi um Horto de todo o dia e da maior parte da noite. Fazia por retirar dele o meu espírito, mas não sei o quê, uma força invisível me unia, prendia o coração àquele solo duro e triste; era um Horto mundial ladrilhado de pedra dura, rochedo inquebrável. Lançou-se sobre mim o peso brutal da humanidade; o seu peso esmagou-me, abriu-me o peito, tirou-me a vida superior, sublime, muito sublime, deu-lhe entrada no coração e abrasou toda a humanidade em amor; triunfou da morte e abraçou toda a ingratidão humana. Vi à minha frente uma floresta de espinhos que atingiam grande altura. Desses espinhos foi formada a minha coroa; tive que atravessá-los e neles da cabeça aos pés foi todo o meu corpo ferido; espetados neles ficaram muitos pedaços das minhas carnes.
(Beata Alexandrina Maria da Costa: Sentimentos da alma, 31 de Janeiro de 1947.)
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