Até aos três anos de idade não me recordo de nada
Até aos três anos de idade não me recordo de nada, a não ser de algum
carinho que dos meus recebia. Com os meus três anos recebi o primeiro mimo de
Nosso Senhor.
Como era desinquieta e, enquanto minha mãe descansava um pouco, tendo-me deitado
junto dela, eu não quis dormir e, levantando-me, subi à parte de cima da cama
para chegar a uma malga que continha gordura de aplicar no cabelo – conforme
era uso da terra – e, por ter visto alguém fazê-lo, principiei também a
aplicá-la nos meus cabelos. Minha mãe deu por isso, falou-me e eu assustei-me.
Com o susto, deitei a malga ao chão, caí em cima dela e feri-me muito no rosto.
Foi preciso recorrer imediatamente ao médico que, vendo o meu estado,
recusou-se a tratar-me, julgando-se incapaz. Minha mãe levou-me a Viatodos, a
um farmacêutico de grande fama, que me tratou, embora com muito custo, porque
foi preciso coser a cara por três vezes e levou bastante tempo a cicatrizar a
ferida. O sofrimento foi doloroso. Ah, se desta idade soubesse já aproveitar-me
dele!... Mas não. Depois de um curativo, fiquei muito zangada com o
farmacêutico; este ofereceu-me alguns biscoitos e vinho, que depois de amolecidos
no vinho queria que os comesse. Eu tinha fome e, às vezes, até chegava a chorar
porque não podia mexer os queixos. Não aceitei a oferta e ainda maltratei o
farmacêutico. Ora aqui está a minha primeira maldade. (Alexandrina Maria da Costa: Autobiografia)
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