sábado, maio 15, 2021

VIAGEM AO PORTO

O meu estado físico era gravíssimo


Pedi durante um mês. Mas, quanta mais luz pedia, mais em trevas ficava, tornando-se assim a dor da minha alma cada vez mais profunda, não sabendo o que havia de fazer, até que Nosso Senhor me disse que era da Sua divina vontade que fosse ao Porto.

O meu estado físico era gravíssimo, temiam tirar-me do leito para tão longa viagem; até eu temia, e muito, pois se não consentia que me tocassem no corpo, como havia de poder ir tão longe!... Animada com as palavras de Nosso Senhor, confiava n’Ele e, sob a Sua acção divina, preparei-me para sair na madrugada de 1 de Julho de 1941. Eram quatro horas da manhã, já eu tinha feito as minhas orações e, para fingir que ia muito alegre, principiei a chamar minha irmã, dizendo-lhe que íamos para a cidade. Só por este meio escondia a minha dor e alegrava os meus. Quando dizia isto, senti o automóvel que pouco depois chegava a nossa casa. Entrou no meu quarto o Sr. Dr. Dias de Azevedo, acompanha por um senhor amigo. Depois de conversarmos um pouco, minha irmã vestiu-se e preparámo-nos para sair. Às 4,50 partimos, era ainda de noite, para não alarmar o povo, e saímos da nossa freguesia sem encontrar ninguém.

Em que silêncio ia a minha alma! Mergulhada num abismo de tristeza, mas sem me separa um momento da união íntima do meu Jesus, ia-lhe pedindo sempre toda a coragem para o exame que ia ter; e pelo seu divino amor e pelas almas oferecia todo o meu sacrifício. Chamava pela Mãezinha e pelos santos e santas a quem mais amava. Não ligava importância a nada e tudo o que se me deparava causava-me profunda tristeza. De vez em quando, interrompiam o meu silêncio perguntando-me se ia bem. Agradecia, sem sair do abismo em que ia mergulhada. Era já dia claro quando parámos em casa do senhor que nos acompanhava, na Trofa. Era aí que eu ia descansar e receber o meu Jesus, esperando pela hora de seguir para o Porto. Antes de continuar a minha viagem, levaram-me ao jardim do Sr. Sampaio. Amparada e sob a mesma acção divina, fui até junto de umas florinhas, que colhi, dizendo: «Quando Nosso Senhor criou estas florinhas, já sabia que hoje as vinha aqui colher.» Depois, fui fotografada em dois lugares escolhidos. Desloquei-me de um lugar para o outro por meu pé, o que nunca pude fazer depois que acamei, pois nem sequer podia voltar-me de lado, na cama. Só um milagre divino, porque sem ele não me mexia, nem sequer consentia que me tocassem.

Depois, entrei no carro, segui a viagem, e a minha alma sofria horrivelmente. À distância de seis quilómetros do Porto, Nosso Senhor retirou a Sua acção divina. Principiei a sentir todos os sofrimentos do meu corpo e tornou-se tormentosa o resto da viagem e disse, não por saber a distância que faltava, mas o meu estado fez-me falar assim: «Já estamos perto do Porto.» E alguém me disse: «Estamos, estamos.» Porque tinha visto que só faltavam os 6 quilómetros a que me referi. (Alexandrina Maria da Costa: Autobiografia)

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