segunda-feira, maio 03, 2021

TU NÃO PECASTE, TEM CORAGEM!

3 de Maio de 1945


No primeiro dia de Maio quantas coisas pedi à Mãezinha para me alcançar no Seu mês bendito. Consagrei-me a Ela para Ela me consagrar a Jesus. Entre muitas outras coisas pedi-Lhe força para o meu sofrimento. Meu Deus, e quanto necessito eu do auxílio do céu, da força da querida Mãezinha, par aguentar com o peso de tão grande cruz. Logo no segundo dia recebi um miminho do céu, um mimo que feriu bem o meu coração, um espinho que o dilacerou todo. Agradeci-o logo à Mãezinha, aceitei-o e ofereci-Lho como prova do meu amor, e para Ela o oferecer por mim a Jesus. Tudo é dor em mim! Que horror, que horror! O meu coração, a minha alma estão num luto fechado; não sei o que é isto. Que arrancos sinto em mim! Sinto como se pela boca me tirassem tudo o que dentro em meu corpo contém. Ai, meu Jesus, e que desejos tão grandes, que ânsias quase desesperadoras de ouvir dizer que terminou a guerra. Eu nada sei dizer, só Jesus conhece quanto sofro. A Ele vou renovando a oferta de vítima, para que venha a paz. Oh! que compaixão eu tenho pelos governadores que dizem terem partido para a eternidade. Oro por eles, e parece-me que a eles prenderam o meu coração. Todo o meu corpo continua em chamas, e sinto como se o meu pequenino quarto ardesse comigo. E quero acudir ao mundo, apanhá-lo, prendê-lo, colocá-lo todo nestas labaredas, neste fogo que não dá luz. Que medo, ó que medo viver em tantas trevas! O quarto em que vivo é como uma masmorra onde nunca penetrou o sol nem a luz do dia. São trevas na alma, trevas no corpo, trevas no céu e na terra. Parece que nunca mais posso ver Jesus, sinto que não é meu, que O perdi para sempre. Mas mesmo assim quero amá-Lo, sinto ânsias loucas de O amar e, como não me parecem minhas nem meu o amor, digo-Lhe:

— Jesus, este anseio não é meu, é Vosso, e Vosso é o amor; sois Vós que amais com o que é Vosso e sois Vós que sofreis e levais a minha cruz. Vede a pobrezinha que nada faz e nada tem: é só noite, só miséria. Sou Vossa escrava, Jesus, só Vossa e da Mãezinha.

O demónio, ainda esta noite, com tanta malícia e fúria consumiu desesperadamente o meu pobre corpo. Estava banhada em suor e não podia lutar. O coração batia com grande estrondo e numa marcha apressadíssima. Queria sossegar uns momentos, para poder respirar, e não podia.

— Já estás satisfeita? Não queres pecar mais? Hás-de pecar, hás-de pecar. Peca contigo todo o inferno e muitos da terra. E nomeava-os. Como tu estás! Como tu estás! E enchia-me de insultos. Estava cheia de lutar, mas não de ofender a Deus. Sentia que queria mais, muito mais. Não era bastante o gozo que me parecia sentir. Veio uma dor a destruí-lo todo. Fiquei louca, a querer gozar, e a dor insuportável a não me deixar, destruía tudo o que era gozo. Perdida no meio do mar, gritei por Jesus:

— Não quero pecar, não quero pecar.

Fora do meu lugar, não podia tomar a minha posição, nem aguentar por mais tempo a que tinha. Falou Jesus:

— Anjo, bendito anjo criado por mim, leva ao seu lugar a minha querida esposa, leva-a com todo o carinho e amor; é minha, só minha.

Fiquei logo na minha posição e senti-me tão cheia de carinho e amimalhada, e Jesus continuou:

— Oferece-me, filhinha amada, esta reparação, para que os impuros se cansem de me ofenderem, e não se canse o meu divino Coração de lhes perdoar. Dá-me, minha virgem pura, toda esta reparação. Tu não pecaste. É grande, é forte o teu amor. Tem coragem! Cumprem-se as minhas divinas promessas, e chega o céu.

As palavras e ternuras de Jesus suavizaram a minha dor e cansaço. Pude por um pouco adormecer. Ai, a quinta-feira! Estou a braços com ela. O meu coração anda de rasto, sente já toda a dor e ingratidão. Os meus ouvidos ouvem dum e do outro lado insultos e palavras de desprezo. Vejo todos os sofrimentos e anseio por eles; vejo a morte e desejo passar por ela; é morte que vai dar a vida. No Horto, senti o cálice da amargura. Com os olhos fitos no céu, no meio da tremenda agonia, senti como se me rasgassem a fio de espada ou ponta de navalha todas as veias do corpo. O sangue corria, ensopou-me toda e foi juntar-se às lágrimas da maior amargura. Os ouvidos tudo ouvem ao longe, mas sinto em mim coisa mais sublime que vê e adivinha tudo. Não sou eu, é Jesus que tudo conhece e sabe. É chegada a prisão. (Sentimentos da alma: 3 de Maio de 1945)

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